Tuesday, April 08, 2008




REINVENTAR A CALIGRAFIA: O NOVO DESIGN GRÁFICO IRANIANO

Penso que nunca o cortejo fúnebre de um designer gráfico mobilizou tantas pessoas, associando honras de estado e emoção popular, como o de Morteza Momayez em 2005.



Não conheço, tão bem quanto gostaria, o trabalho de Momayez, mas creio que, em certa medida, ele representa um lugar de identidade da pátria iraniana, para a qual confluem diversas tradições, Árabe e Persa, ancestral e moderna, erudita e popular, autoral e pública, que, em uníssono, se expressam na escrita Farsi. Importa recordar que o Irão é um território habitado por dezenas de diferentes grupos étnicos que falam diferentes línguas e dialectos, que possuem diferentes origens e tradições mas que escrevem num único alfabeto, o Farsi.

Pintura caligráfica de Mohammed Ehsaei.

Ainda antes de Reza Abedini, não só um dos mais importantes designers gráficos da actualidade mas um decisivo divulgador do design iraniano, ter editado o seu New Visual Culture of Modern Iran, interessava-me já pela força extraordinária do design iraniano; não compreender a língua, não me parecia, face a extraordinária eloquência visual, uma limitação para entender aqueles trabalhos fortemente tipográficos, expressivamente cromáticos que, aos olhos de um ocidental, despertavam fantasiosas narrativas.

Logótipo do Museu Reza Abassi.

A nova cultura visual iraniana, que Abedini apresenta no seu livro, nasce na década de 1960 e conhecerá três períodos distintos. O primeiro período caracteriza-se por uma das mais extraordinárias revoluções do design gráfico da segunda metade do século XX, contemporânea da renovação holandesa (promovida por Wim Crouwel ou Pieter Brattinga) e da renovação japonesa (desenvolvida por Masuda Tadashi, Yusaku Kamekura, Tadanori Yokoo ou Shigeo Fukuda) mas menos conhecida (mesmo um historiador atento como Meggs ignora-a), que se estende entre 1960 e 1979, período marcado por uma forte questionação da identidade visual iraniana acompanhada de uma intensa recuperação e reinterpretação de toda uma tradição visual, muito assente na tradição caligráfica. A produção gráfica deste período, que termina com a revolução iraniana de 79, é indissociável de Momayez.

Cartaz de Majid Abbsi.

Cartaz de Mehdi Saeedi.

À extraordinária fertilidade deste período, segue-se uma década de estagnação marcada pela Guerra Irão-Iraque e consequentes fecho de fronteiras, embargo económico, corte de relações com a UE e os EUA. A produção gráfica desse período é quase exclusivamente de propaganda e não se apresenta particularmente interessante.

Uma nova geração de designers iranianos, desponta no pós-guerra. Alguns deles, como Saed Meshki ou Reza Abedini, formam-se ainda antes do pós-guerra mas outros, como Farhad Fozouni ou Iman Raad nascem já após a revolução iraniana e formam-se no pós-guerra.

Cartaz de Iman Raad.

A razão da “identidade” e da maturidade do trabalho destes jovens designers talvez resida da combinação de referências e influências. São designers que admiram a tradição da caligrafia Persa, que se deixam influenciar pelos mestres calígrafos e por Morteza Momayez mas que também que se relacionam também com a influência de Reza Abedini e Neville Brody, que combinam referências da tapeçaria persa e da nova tipografia digital.

A “terceira vida” do design gráfico iraniano contemporâneo não pode ser desligada da acção do colectivo 5th Color é criado em 2001 e envolvendo alguns dos mais importantes designers iranianos procurou, por exemplos em exposições como Bouf-e Kour (2002) e Self-Portrait (2004) voltar a afirmar uma especificidade da linguagem visual iraniana, numa espécie de retorno aos objectivos perseguidos por Momayez meio século antes, que visavam lançar um olhar contemporâneo sobre as herança caligráfica iraniana. A nova geração aprendeu com mestres calígrafos como Mohammad Ehsaei o criador do logótipo do Museu Reza Abassi ele próprio um herdeiro de mestres como Mirza Gholamreza ou Mir Hossein, no final do século XIX, exploraram novas possibilidades visuais de utilização da língua Farsi.



Crescentemente reconhecido no ocidente, o design gráfico iraniano apresenta-se hoje muitíssimo activo, possuindo boas escolas, uma invejável Associação de Design Gráfico e um largo número de talentosos designers, prolongando esse riquíssimo encontro entre tradição e inovação visual.





Cartazes de Reza Abedini (n. 1967).






Cartazes de Mehdi Saedi.



Cartazes de Farhad Fouzoni (n. 1979).

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REACTOR é um blogue sobre cultura do design de José Bártolo (CV). Facebook. e-mail: reactor.blog@gmail.com